Justiça proíbe empresas de aplicar cobrança abusiva na venda de terrenos em Cravinhos, SP
27/07/2025
(Foto: Reprodução) MP investiga empresas por venda irregular de lotes com juros abusivos em Cravinhos, SP
A Justiça de Cravinhos (SP) concedeu uma liminar que proíbe três empresas de aplicar cobranças abusivas na venda de terrenos no loteamento Jardim Aliança. A medida atende a um pedido do Ministério Público (MP) para proteger consumidores que alegam ter sido lesados por contratos com juros e correções monetárias irregulares. A prática resultou em endividamento excessivo.
No pedido, o MP apontou que os contratos eram redigidos de forma desequilibrada, omitindo informações essenciais, como o valor real do imóvel e os encargos aplicados.
Além disso, penalidades rigorosas eram impostas exclusivamente aos compradores, sem contrapartidas proporcionais aos vendedores, ferindo os princípios da boa-fé objetiva e da transparência.
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Entre as práticas abusivas agora proibidas pela liminar estão:
Cobrar juros e correção monetária sem apresentar o valor real do lote na época da contratação
Promover ou dar continuidade a ações de cobrança ou execução relativas à aquisição de lotes em trâmite na comarca
Realizar novas vendas sem especificar de forma clara o valor real do imóvel
Constituir garantias fiduciárias sobre imóveis já vendidos sem o consentimento dos compradores
Segundo o promotor Marco Antonio Martins Fontes Custódio, responsável pelo caso, ao menos 200 compradores foram prejudicados. Em alguns casos, mesmo após renegociações, os valores das parcelas permaneciam com taxas indevidas, impedindo a quitação da dívida.
A liminar ainda prevê multa diária de R$ 10 mil por consumidor prejudicado em caso de descumprimento.
Um inquérito policial está em andamento para apurar crimes como a venda irregular de lotes, crimes da lei do parcelamento do solo, contra o consumidor e patrimoniais.
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Esquema de vendas e irregularidades
O promotor explicou que as empresas utilizavam a mesma estrutura societária para aplicar em novas vendas à medida que as pessoas descobriam as irregularidades nas cobranças.
Na verdade, os consumidores eram ludibriados. Eles adquiriam contratos com imóveis, loteamentos por um valor muito acima do valor real, muitas vezes já calculado com juros e correção monetária. A verdade é que todo o consumidor tem o direito de saber o valor efetivo total. O que acontecia era que muitas vezes o valor do contrato já era colocado o valor efetivo total nos juros e correção monetária incidia sobre o valor efetivo total", destacou.
A prática consistia em calcular juros compostos sobre o valor efetivo total do imóvel, o que fazia as parcelas dispararem em pouco tempo.
"Lotes que eram de valores pífios, R$ 500, R$ 600, eles ultrapassavam R$ 2 mil, ou seja, um aumento de 100%, 200% em questão de dois, três anos. Isso gerava o superendividamento, uma bola de neve e que milhares de pessoas, especialmente de baixa renda, se sujeitaram a dívidas praticamente insuperáveis", pontuou o promotor.
Além disso, o promotor explicou que os contratos eram personalizados, com critérios e valores diferentes para cada comprador, mesmo para o mesmo lote. "Se você ligasse lá para comprar o mesmo terreno do que eu comprasse, seriam situações completamente distintas, tanto em juros, tanto de correção monetária".
Bairro Jardim Aliança, Cravinhos (SP).
Reprodução EPTV
Sonho que virou pesadelo
O loteamento Jardim Aliança surgiu em Cravinhos em 2012 e conta com 1,4 mil lotes. Muitos já foram vendidos e possuem casas construídas, mas a promessa da casa própria se tornou um pesadelo para diversos moradores.
O mecânico José Ricardo Augusto comprou um terreno em 2012 e viu o valor escalonar a ponto de o pagamento se tornar inviável.
"Para nós, quando fomos comprar, falaram que a parcela era R$ 690. Eu perguntei quanto aumentaria por ano, e me falou que aumentaria de R$ 20 a R$ 30. Só que no final da parcela agora já estava R$ 2,8 mil. Foi onde não dei conta de pagar mais", disse.
Há casos em que moradores, mesmo após pagar boa quantidade de parcelas, são chamados para renegociar e perdem o que já foi pago, tendo que recomeçar o financiamento do zero. Foi o que aconteceu com a dona de casa Adriana Gusmões Turcheti.
A prestação do terreno dela começou em R$ 809 e chegou a R$ 2,5 mil por mês. Ela tentou renegociar, mas sem sucesso, e disse que foi coagida a fazer um novo acordo. Com isso, diz que perdeu o que já havia pago e reiniciou as parcelas por mais 16 anos.
"Faltava quatro anos para pagar, mas agora perdemos tudo o que pagamos e agora temos mais 16 anos, o valor no momento é quase R$ 1.000 por mês, por enquanto", completou.
O advogado Silvio César Oranges, que representa um grupo de moradores, diz que o problema se tornou coletivo e que muitos deles, em posição de extrema vulnerabilidade, estão optando por abrir mão do imóvel.
"A empresa quando se propõe a fazer algum tipo de negociação fica mais inviável ainda. As pessoas vão, tentam fazer uma negociação e acabam pagando dois ou três lotes no final. É um negócio civil na qual ficou inviável para uma das partes. O consumidor aqui ficou em uma posição extremamente vulnerável".
Justiça proíbe empresas de cobrança abusiva na venda de terrenos em Cravinhos.
Reprodução EPTV
As próximas etapas
Com a liminar, todas as ações de cobrança e execução relativas à aquisição de lotes que tramitam na Comarca de Cravinhos foram suspensas.
"É o momento que as pessoas têm também agora de poder aproveitar essa decisão liminar enquanto ela tiver efeito, para reorganizar financeiramente e buscar também, através dessa empresa, uma renegociação justa", orientou o promotor.
O que dizem as empresas?
As empresas Planejamento Habitacional (PHU), Urbras Urbanizadora Brasileira e Loteamento Jardim Cravinhos são do mesmo dono, o empresário Rubem Maynardes Araújo Junior.
Procurada, somente a empresa PHU respondeu, em nota, que ainda não foi citada na medida judicial e que os contratos formalizados entre ela e os compradores de terrenos no loteamento Jardim Aliança atendem à legislação do consumidor.
A PHU também disse que não existe qualquer abusividade ou irregularidade e que permanece à disposição das autoridades para negociar, de forma clara e de boa-fé, as dificuldades de pagamento para que os clientes possam manter seus terrenos.
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