Mulher com câncer espancada por secretário de Calumbi tinha se abaixado para pegar remédio quando foi agredida, diz advogada
11/12/2025
(Foto: Reprodução) Secretário municipal de Calumbi é preso por espancar esposa com bastão no Recife
Paciente com câncer, a mulher de 57 anos espancada com um bastão dentro de um apartamento no Centro do Recife, na terça-feira (9), foi agredida após se abaixar para pegar um remédio, segundo a advogada criminalista Manuela Magalhães, que representa a vítima.
O suspeito do crime é o marido, o sargento reformado Numeriano Luiz de Sá, de 64 anos (veja vídeo acima). Secretário de Esportes e Lazer de Calumbi, no Sertão de Pernambuco, Nô Numeriano, como é conhecido, foi preso em flagrante por tentativa de feminicídio e, em audiência de custódia, teve a prisão preventiva decretada pela Justiça. A defesa dele preferiu não se pronunciar sobre a decisão.
"Caiu um medicamento atrás da geladeira, e ela pediu para o marido dela afastar a geladeira. Quando ela pediu para ele afastar, ela pensava que ele ia descer para pegar o medicamento, só que ele não desceu e ficou fora da visão dela. Quando ela desceu [para pegar o remédio], sentiu uma pancada atrás da cabeça", contou.
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De acordo com a advogada, após o primeiro golpe, a vítima ainda pensou que tinha batido em algum objeto ou levado um choque da geladeira.
"Quando ela se deu conta, ele já estava em cima dela com um pau, um pedaço de madeira, batendo na cabeça dela. E ela começou a gritar", disse.
A mulher, que, segundo a defesa, pediu para não ser identificada, foi resgatada pelo vizinho que mora no apartamento de cima e levada ao Hospital Português, na área central da cidade, onde está internada.
Conforme a advogada, a vítima se sente culpada pelas agressões que sofreu e apresenta falas de alguém que passou por violência psicológica e moral.
"Aí você percebe muito que é o ciclo da violência. Ela trouxe para a gente essa questão de: 'ah, se o remédio não tivesse caído, isso não teria acontecido' ou 'ele fazia um grande favor de estar comigo'. São crenças totalmente distópicas que uma pessoa que sofreu violência psicológica tem para entender o quanto dependente emocional é daquela outra pessoa", afirmou.
"Acidente doméstico"
Um parente da vítima, que preferiu não se identificar, contou que, assim que soube do ocorrido, ligou para a mulher, mas quem atendeu foi o marido. De acordo com o familiar, na conversa, Numeriano disse que a esposa tinha sofrido um acidente doméstico.
"O celular já estava em posse do marido dela e ele atendeu a ligação nervoso. Disse que ela tinha se abaixado para pegar o medicamento, ficado tonta e caído, que estava com muito sangue e que os vizinhos tinham socorrido e tinham levado ela para algum lugar que ele não sabia", contou.
O parente disse também que não acreditou na versão do homem e, enquanto seguia para o apartamento da vítima, soube que ela havia sido levada para o Hospital Português.
Segundo ele, a mulher mora em Serra Talhada, também no Sertão de Pernambuco, e costumava ir à capital para realizar tratamento contra um câncer de intestino, diagnosticado em 2021. Ela também aproveitava essas viagens para visitar a filha, de outro casamento, que vive em Timbaúba, cidade da Zona da Mata Norte localizada a 99 quilômetros do Recife.
"Inicialmente, ela foi feliz no tratamento, só que ela ficou com algumas sequelas, em decorrência do tratamento, que foi uma neuropatia (disfunção neurológica). E foi exatamente um medicamento para essa neuropatia que ela estava tentando tomar no momento em que isso aconteceu", contou.
O parente disse, ainda, que a vítima nunca relatou ter sofrido outras agressões físicas, mas que as falas dela reforçam a violência psicológica mencionada pelas advogadas.
"Entre quatro paredes, na vida de um casal, a gente não sabe exatamente as coisas que ocorrem. A gente nunca foi reportado por parte dela de nenhum tipo de violência física, ela confirmou isso durante esses últimos dias. [...] E a gente percebeu que, na verdade, existia, sim, por parte dele a tentativa de fazer com que ela desacreditasse de si mesma. Falava sempre que ninguém gostava dela, que a única pessoa que gostava dela de fato era ele", afirmou.
Numeriano Luiz de Sá, conhecido com Nô Numeriano, é secretário de Esportes e Lazer de Calumbi, no Sertão de Pernambuco
Reprodução/Instagram
Perícia e divórcio
A advogada criminalista Letícia Menezes, que também atua na defesa da vítima e acompanhou a perícia realizada pelo Instituto de Criminalística (IC), disse que ainda não conseguiu identificar onde o agressor pegou o pedaço de madeira usado no espancamento.
"Lá [na residência da vítima], a gente tentou identificar junto com os peritos de onde era a madeira, se tinha algum pedaço faltando em algum lugar, em uma cadeira, em um móvel, em uma prancha na cozinha, nada. [...] A perícia é que vai entregar esse trabalho", conta.
Ela também acompanhou os peritos no chamado "estudo da cena do crime", etapa em que especialistas vão ao local para catalogar como tudo estava no momento da ocorrência.
"A gente acompanhou os peritos até a casa que se mantinha fechada desde da ocorrência e lá eles fizeram todo o estudo dentro do apartamento, tirando fotos, realizando todo o estudo necessário para verificar os indícios, os vestígios, toda a atmosfera do crime, entregar um laudo que componha o inquérito policial, toda a investigação para que a gente possa caminhar com a ação penal", detalhou.
Em paralelo ao processo criminal, a advogada de família Lorena Guerra, que também representa a vítima, afirmou que resguardar a mulher e realizar o divórcio são prioridades.
"É importante agora resguardar a vítima, sobretudo com o divórcio, que, nesse caso, será necessário e, principalmente com a partilha, tendo em vista a proteção patrimonial. Ora, já foram diversas violências sofridas ao longo desses praticamente 30 anos, que é o que eu costumo dizer. A gente, de fato, só conhece o outro no no fim", contou.
Ela acrescentou que outros pontos também serão analisados, especialmente aqueles que garantam proteção financeira, emocional e jurídica à vítima em toda a tramitação do processo.
"Iremos também analisar, dentro desse caso, junto com a com a questão criminal, da necessidade dos alimentos indenizatórios para que ela possa ter um suporte enquanto tramita o processo, se livrar desse ciclo de violência e seguir em paz", disse.
Atendimento para vítimas de violência
No Recife, mulheres vítimas de violência podem receber acolhimento, atendimento multidisciplinar e orientações de profissionais especializados nos seguintes locais:
Centro de Referência Clarice Lispector: Rua Doutor Silva Ferreira, 122, Santo Amaro (atendimento 24 horas);
Serviço Especializado e Regionalizado (SER) Clarice Lispector: Avenida Recife, 700, Areias (atendimento de segunda a domingo, das 7h às 19h);
Salas da Mulher em cinco unidades do Compaz — Eduardo Campos (Alto Santa Terezinha), Ariano Suassuna (Cordeiro), Dom Hélder Câmara (Coque) e Paulo Freire (Ibura).
Além disso, existe um Plantão WhatsApp, com funcionamento 24 horas, no número (81) 99488-6138.
Saiba como denunciar
Em Pernambuco, as denúncias de violência contra mulher podem ser feitas através do telefone 180, da Central de Atendimento à Mulher, que funciona 24 horas por dia, inclusive aos finais de semana e feriados;
A Polícia Militar pode ser contatada pelo 190, quando o crime estiver acontecendo;
Também é possível, no Grande Recife, fazer denúncias pelo Disque-Denúncia da Polícia Civil, no número (81) 3421-9595;
O Ministério Público de Pernambuco (MPPE) também pode ser acionado de segunda a sexta-feira, das 12h às 18h, por ligação gratuita para o número 0800.281.9455;
Outra opção é a Ouvidoria da Mulher de Pernambuco, que funciona pelo telefone 0800.281.8187;
Os endereços e telefones das Delegacias da Mulher podem ser consultados no site do TJPE.
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